
15 de dezembro de 2017 – Seul, Coreia do Sul – Uma tela exibe os preços do bitcoin em uma casa de câmbio de moedas digitais em Seul. O governo sul-coreano analisa formas de regulamentar as negociações especulativas de criptomoedas, já que o recente salto nos preços alimenta o entusiasmo pelos bitcoins. (Foto de Seung-il Ryu/NurPhoto via Getty Images)
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Muitos analistas internacionais ainda enxergam a Coreia do Sul por uma perspectiva ultrapassada. Se você perguntar a especialistas do mercado cripto ocidental sobre o cenário sul-coreano, provavelmente vão citar alto volume de negociações de varejo, ciclos acelerados de altcoins e a era do “kimchi premium”, quando o bitcoin era negociado bem acima dos preços globais. Embora essa visão tenha fundamento, ela também limita a Coreia do Sul a um momento que já não traduz sua influência ou ambição atual.
A Coreia do Sul foi pioneira. O mundo simplesmente não percebeu. Agora, usuários e empresas de cripto locais têm vantagem competitiva.
O país adotou inovações das redes Bitcoin e Ethereum antes da maioria dos mercados identificar o potencial, e a profundidade da base de usuários inicial criou condições únicas. Hoje, a Coreia do Sul possui um ambiente regulatório maduro, instituições engajadas, forte demanda corporativa por aplicações em blockchain e uma cultura desenvolvedora robusta. O resultado é um mercado mais preparado do que a maioria para liderar a próxima fase dos ativos digitais.
A Chainalysis, empresa de análise em blockchain, classificou a Coreia do Sul como a 15ª nação mais ativa no Índice Global de Adoção de Cripto 2025. Isso é expressivo para um país onde mais de 20% da população tem mais de 65 anos, segundo dados oficiais, e ainda assim, a Coreia do Sul exerce impacto desproporcional sobre os ativos digitais globais.
A Korea Blockchain Week é um reflexo dessa transformação. O que começou como uma iniciativa para reduzir o gap de informação entre Coreia do Sul e o mundo tornou-se um dos maiores eventos cripto do planeta. Mais de 136.000 pessoas participaram desde o início da conferência anual. E o ritmo de crescimento segue acelerado. Muitos empreendedores coreanos afirmam que o avanço da KBW acompanha o crescimento do país na economia global.
“Externamente, ainda veem a Coreia sob a ótica da especulação,” diz Seonik Jeon, um dos organizadores da Korea Blockchain Week e CEO da Factblock, em entrevista. “Não enxergam o trabalho de engenharia, os pilotos corporativos ou os desenvolvedores que já fazem P&D há anos.”
O marco cultural das criptomoedas na Coreia do Sul ocorreu em 2017, com uma onda de ICOs atraindo investidores de varejo e levando o preço do bitcoin a novos recordes, justamente no momento do halving da mineração. Os ativos digitais viraram tema nacional. Mas aquele bull market não foi um fenômeno passageiro: foi resultado de uma infraestrutura construída desde 2013, quando a Korbit tornou-se a primeira exchange local, seguida pela Bithumb em 2014%20is,rebranded%20as%20Bithumb%20in%202015.).
No fim de 2017, o volume diário de negociações cripto na Coreia do Sul atingiu patamares que superaram grandes mercados de ações. O won sul-coreano tornou-se a terceira moeda mais negociada nos mercados globais de bitcoin, atrás apenas do US$ e do iene japonês.
Nesse momento, a Coreia do Sul mostrou um padrão que definiria a década seguinte. Quando uma nova tecnologia chega, os sul-coreanos não esperam por validação externa. Pessoas de todas as origens, não só a elite tech, mergulham de cabeça.
Apesar da diversidade de negócios e usuários locais, a narrativa internacional reduziu o país a um ambiente de alto volume de negociação. O colapso do projeto Terra e as sanções regulatórias reforçaram estereótipos.
Um dos motivos da baixa visibilidade da cena cripto robusta em Seul é a barreira linguística. Muitos projetos sul-coreanos não têm cobertura internacional em inglês. Outro fator é o histórico de ciclos especulativos, que obscurece a profundidade institucional e tecnológica do país.
Jeon lançou a KBW em 2018 e os ingressos se esgotaram rapidamente, sinalizando o potencial do país para eventos de escala global.
“Foi uma ponte para conectar a comunidade coreana ao mundo e vice-versa,” disse Jeon.
Nos anos seguintes, a participação cresceu rapidamente, mesmo com a ampliação dos espaços, e líderes globais passaram a buscar presença no evento.
Enquanto isso, desenvolvedores de IA, games e blockchain criam há anos ferramentas prontas para produção. Grandes bancos sul-coreanos estudam custódia de ativos digitais, títulos tokenizados e sistemas de liquidação em blockchain. O país mantém um dos frameworks de compliance mais sólidos para exchanges do mundo, respaldado por políticas como o sistema de negociação com nome real de 2018.
A Coreia do Sul não é apenas um mercado de negociação. Está se consolidando como potência de engenharia e negócios corporativos.
A transição corporativa já é visível na infraestrutura do mercado. Shinhan Investment Corp. e NH Investment & Securities concluíram testes sandbox de títulos tokenizados para títulos fracionados e ativos imobiliários, sinalizando que grandes instituições financeiras se preparam para mercados tokenizados em larga escala. Ao mesmo tempo, o sistema de verificação de nome real cobre quase 100% das contas de exchanges locais, combatendo fraudes e operações fictícias com eficácia superior à maioria dos mercados ocidentais. Esses avanços mostram um país construindo bases institucionais sólidas para ativos digitais, não apenas participando de ciclos especulativos.
A adoção precoce seguiu apesar da volatilidade, especialmente após o colapso do Terra/Luna em 2022, que aumentou a cautela de investidores institucionais globais. Para recuperar a confiança pública, reguladores locais precisaram comprovar a robustez e confiabilidade internacional de seus frameworks de compliance.
Em 2025, a Coreia do Sul passa por uma transição de adoção voltada ao consumidor para desenvolvimento liderado por empresas. Corporações coreanas absorvem novas tecnologias rapidamente, e com blockchain não é diferente. Bancos estudam custódia e produtos financeiros tokenizados. Empresas de logística e manufatura buscam transparência via blockchain. Empresas de games integram ativos digitais em suas plataformas, tanto para consumidores quanto para uso corporativo. O B2B já supera o crescimento voltado ao consumidor.
“Empresas coreanas agem rápido quando identificam resultados,” diz Jeon. “Um produto de sucesso para o consumidor vira referência para adoção corporativa.”
Se a adoção corporativa definir o próximo capítulo das criptos, a Coreia do Sul não só está pronta — já pode estar à frente.
A Coreia do Sul foi uma das primeiras nações a criar frameworks claros para negociação e compliance. O sistema de negociação com nome real reduziu excessos especulativos e garantiu transparência, enquanto outros países ainda não tinham medidas equivalentes. Iniciativas como a Lei de Proteção ao Usuário de Ativos Virtuais e as diretrizes de Security Token Offerings reforçaram a supervisão sem travar a inovação, embora desafios persistam.
Apesar do ambiente regulatório progressista, a Coreia do Sul ainda precisa alinhar-se mais aos padrões globais, especialmente Europa e América do Norte. Uma abordagem regulatória flexível pode manter a vantagem competitiva do país no cenário dinâmico dos ativos digitais.
Jeon acredita que a recente eleição, vencida pelo ex-opositor e atual presidente Lee Jae-myung, trará avanços graduais, não mudanças abruptas. Ambos os principais partidos reconhecem que quase 6 milhões de coreanos possuem criptoativos e propõem políticas para apoiar o setor de blockchain. Com o tempo, isso pode ampliar a participação institucional, com bancos oferecendo serviços de ativos digitais e corretoras atuando com produtos financeiros tokenizados.
A Coreia dificilmente buscará desregulamentação rápida, mas seguirá refinando regras que equilibram proteção ao investidor e crescimento de mercado. Para muitas instituições, a estabilidade operacional é um diferencial do país.
Jeon pretende transformar a KBW em uma série de eventos ao longo do ano, não apenas na conferência anual. Para isso, a FactBlock desenvolve o FABLO, plataforma digital para expandir a comunidade KBW para um ambiente permanente.
Além da KBW, Seul se consolida como hub global graças a políticas inovadoras que atraem talentos e empresas. O próximo passo será a consolidação de projetos de destaque com liderança internacional. Mas a base já existe. Segundo o Developer Report 2024 da Electric Capital, a Ásia concentra 32% dos desenvolvedores ativos, e a Coreia do Sul é um dos ambientes mais democráticos e com frameworks regulatórios maduros.
Questionado sobre a mensagem para construtores e investidores estrangeiros, Jeon afirma: “Observem a Coreia. O país tem cultura de inovação, população que entende ativos digitais e instituições preparadas para a próxima geração da tecnologia blockchain.”
Equipes globais costumam testar novos produtos cripto primeiro na Coreia do Sul, pois o mercado é exigente, engajado e leal quando convencido.
Considerando todos os fatores, se a próxima década das criptos for marcada por adoção corporativa, clareza regulatória e rápida experimentação do consumidor, a Coreia do Sul já está pronta para liderar.





